Este post é candidato ao concurso “O melhor post do mundo da Limetree“
Minha mãe era professora da rede pública estadual de São Paulo.
E como em toda escola que se preze – ou melhor dizendo, em todo lugar que há uma aglutinação feminina – rolava um papo e um comércio no horário do intervalo. Era uma troca de receitas, um tal de trazer os panos de pratos que a tia pintava, uma venda do bolo que a madrinha fazia ou mesmo os lindos artesanatos produzidos pela merendeira.
Neste vai e vem de mercadorias tinha alguém que fazia crochê. Não sei bem precisar o sujeito (ou seria a sujeita?) mas o fato é que esta pessoa fazia um crochê danado de bom.
E de caro.
Minha mãe sempre foi uma pessoa com olhar treinado para o requintado, o bem acabado, o bem feito.
E obviamente se encantou pelo trabalho da tal pessoa.
Namorava, namorava as peças.
Sem consumar casamento.
Até que um dia, eu me lembro como se fosse hoje: minha mãe chegando à tarde em casa com uma pesada colcha de crochê nas mãos.
Disse que tinha parcelado em três ou quatro vezes e tinha um indisfarçável sorriso de satisfação nos lábios.
Foi me mostrando a colcha com todo carinho & orgulho e ao final pontuou:
“É para o seu enxoval.”
Eu, moleca de tudo, segurei as palavras para não verbalizar o “eu nunca usaria nada assim, tô fora!” para não entristecê-la mas tinha por certo que, infelizmente, a tal colcha não faria parte do meu repertório matrimonial. Soltei um “legal” e ficou por isto mesmo.
Porque a ousadia tinha sido “mascarada” pela desculpa do enxoval da filha mulher.
Algumas vezes incentivei minha mãe a usar a colcha na cama dela – coisas que ela fazia como uma grande traquinagem para depois guardar novamente “meu tesouro”.
Alguns já sabem que há tempos minha mãe faleceu (para quem não sabia, apresento a notícia).
Neste meio tempo a colcha ficou esquecida na casa do meu pai.
Rolou de um lado para o outro sem uso certo, sem cuidado nem carinho.
Há mais ou menos um ano resolvi resgatá-la.
Trouxe-a aqui para casa e a deixei esquecida em um armário.
Nesta semana resolvi abrir a embalagem e acomodá-la aos pés da minha cama como vejo em muitas revistas.
O fato é que a colcha é demasiadamente estreita para a dimensão do meu colchão – mas como a vontade de tê-la por perto era maior acomodei-a na diagonal para que cobrisse toda a extensão.
(Ou seja, quando queremos algo, definitivamente, conseguimos)
Hoje minha mãe completaria 68 anos – idade que eu tenho que usar a calculadora para rememorar, visto que há 14 anos ela faleceu e eu, por muitas vezes, tento não sofrer por isto.
Mas escrevendo esta postagem eu chorei.
De saudades.
Daquelas saudades boas que só acontecem quando temos história e amor no coração.
E é isto, mãe.
Este é meu presente para você.
O acaso, o destino, fez com que eu me lembrasse da colcha e da história na semana do seu aniversário.
Eu coloquei você mais uma vez vizinha, tentando materializar nossa relação.
Tudo mudou, tudo caminhou.
A cama é grande, mas você cabe exatamente no meu coração.
Feliz aniversário!